2006-10-10

Fujam da parteira!...

Ainda não vos disse que as minhas origens são muito citadinas. Nasci a dois passos de Lisboa, ou melhor, a duas braçadas já que a minha terra de infância fica do outro lado do rio. Cresci sempre perto do mar e passava as férias com o meu pai, sulcando o Tejo num barco à vela. Quando me casei, mudei de zona e fiquei novamente junto ao mar. Trabalhei na Baixa de Lisboa onde chegavam os aromas da maresia e as sombras das gaivotas. Um dia resolvemos abandonar a grande cidade e partir para terras da Beira, mudando todo um estilo de vida. Passámos a ser agricultores e criadores de gado por opção. E desde então tem sido uma vida intensa, cheia de emoções. Cada manhã promete um dia diferente dos anteriores. Acabou-se a rotina, os bocejos, os dias cinzentos. Apenas sentimos duas faltas: o cheiro do mar e os gritos das gaivotas.
Esta explicação era devida a quem nos lê para perceber porque é que nos apresentamos sempre tão ignorantes de tudo. Alguns dos nossos êxitos só acontecem depois de uma quantidade imensa de insucessos.
Agora já podemos continuar: ontem nasceram dois borreguinhos. Melhor dizendo, um casalinho. São bonitos e bem amados pela mãe verdadeira.
Deixei de lhes dar nomes porque já me apercebi que não consigo fixar 40 nomes diferentes para cada elemento do rebanho. O macho mais velho é que mantém o mesmo desde a 14º. a 17º. geração e que é o de Jacob.
De manhã ao abrir o estábulo ouvi logo aquele borregar de recém-nascido e disse: -Olá! Já há cá gente nova!
Normalmente os partos são fáceis e a maioria ocorre durante a noite.
O ano passado estava no pasto a tratar da Branquinha, a nossa burra inteligente, e vi uma ovelha deitada e com contracções. Percebi logo que ia parir e fui ajudá-la. A ovelha levantou-se e dirigiu-se para o estábulo, presumi que seria para parir de uma forma mais recatada. Reparei que já tinha uma coisa a aparecer na vagina. Segui-a e deitei-a no chão. Tentei puxar por aquilo mas era surpreendentemente duro. Comprimi-lhe mais a enorme barriga para ajudar o borrego a descer. Sentei-me em cima dela. E a ovelha com contracções umas atrás das outras e nada a sair lá de dentro. Fui espreitar novamente e tornei a puxar por aquele pedaço de carne que teimava em resistir-me.
Sem saber mais o que fazer, telefonei para o veterinário, contei-lhe a história da bicha, do esforço que estava a fazer para parir, e do meu de não conseguir puxar aquilo para fora. O veterinário ia fazendo-me mais esta e aquela pergunta e a dada altura disse-me assim:
-Olhe, Dona Ana! Não puxe mais por isso. Faça o contrário. Empurre, empurre para dentro! É que a ovelha está a fazer um prolapso da vagina!!
Calculo que devo ter sido motivo de chacota durante muito tempo na clínica veterinária.
Mas então o problema do prolapso tinha que ser resolvido!
Todos os dias empurrava aquele pedaço de carne para dentro e no dia seguinte já estava de fora. Passei a empurrar encharcando a vagina com vinagre e açúcar (já nem sei quem é que me deu esta receita) e tornava a sair à mesma. E uma manhã tive uma daquelas ideias malucas: pedi ao caseiro para segurar a ovelha com força, fui buscar agulha e linha e vá de costurar, unindo e por isso diminuindo a "boca" da vagina. A ovelha queixou-se um bocado mas ficou um trabalho perfeito. Nunca mais apareceu aquela carne de fora. E entretanto pariu ontem, sem problemas :))))
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6 comentários:

Anónimo disse...

Fiquei burro com este post. Felizmente, as ovelhitas da minha mãe nunca tiveram disso...

Filipe disse...

O que eu vou aprendendo aqui.

Anónimo disse...

Não consegui evitar... grandes gargalhadas soaram aqui deste lado quando lia o final do post...
Desgraçados dos animais, mas... bem! a ovelha sobreviveu, menos mal.
Afinal o "cirurgiã escritora" não era um nick tão mau como isso:)
Um beijinho grande

Fatima Vinagre disse...

Eu estudei na Faculdade da Costa da Caparica. Atravessava todos os dias aquela maldita (por causa do trânsito é claro!) ponte.
Que fotografia mais bonita! São tão lindos. Também já vi que se adaptou muito bem à nova vida e, com coragem! Bj

Anónimo disse...

Que mulher de coragem! Estou a referir-me ao episódio com a mãe ovelha, clro.
As temporadas que vivi no campo - onde habitei por dois largos períodos para além da minha infância (em que repartia o tempo entre a casa dos pais na cidade e dos avós fora dela)- foram também as mais felizes da minha vida.
Abraço do Porto

Ana Ramon disse...

Pois são as tais aventuras/desventuras. Umas acabam bem e outras mal. É a lei da Natureza sempre a esbarrar na intervenção do Homem. Ainda bem que apareceste Fátima. A ver se em troca de mostro a nossa lagoa. E tu Manuela, não estava nada à espera da visita. Foi um prazer. Um abraço muito grande para todos os amigos que nos vêm acompanhando